Ah o tempo, essa entidade que ganha guarida a cada prazo, ou por obra do acaso no que dizemos sincronicidades da vida.
É coadjuvante, mas não quer esse papel. Seu lugar é sob o holofote enunciando, em voz estridente, que estamos atrasados e que a prioridade era outra. Há de ser vidente!
A vida passa rápido que clichê! Mas de repente sou eu a olhar o relógio sem entender para onde foram as horas que eu jurava ter?
Tanto já disseram a respeito dele que sinto não trazer nada novo só a angústia de quem vê o danado escorrendo por entre os dedos antes que eu pudesse pedir socorro.
Dizem que ele pode ser inimigo ou aliado Será? Só consigo ver um lado. Pressão, envelhecimento responsabilidade, atraso, ranço. E quando a coisa tá boa, e queremos que ele seja manso, passa ele correndo. Ô entidade à tôa.
Mas para uma coisa ele serve, isso eu reconheço, ele incita o início, espreme o meio mas dá fim! Ô glória! Deixa pronto o recomeço.
Eu gosto da finitude. Gosto do renascimento e da transmutação Porque não é na inércia que se gera evolução.
E se é para brigar com alguém da hora em que acordo até alcançar a calma da terceira taça, que seja com ele, que em mim já tem morada. Um dia de cada vez, não importa o que eu faça sempre focando em ir além.
Ah, tempo! O que dizer de ti, amigo – ou inimigo – de infância? Senão que andamos juntos sempre atendendo o ritmo da emoção?
Mas precisamos ajustar uma coisa, será que podemos? Quando bater mais rápido o coração, segure os ponteiros pela mão. Dê mais chronos ao kairós, e prometo que daqui, seguiremos nós. Andando. Passo a passo. A sós.
Fui pesquisar sobre a origem da palavra escrever. Gosto de estudar sobre isso. Muitas vezes não nos damos conta do quanto a própria representação gráfica diz sobre o seu significado. Pois bem, escrever vem de “marcar com estilo”. Talvez venha daí o motivo de, em algumas línguas de origem latina, caneta se chamar estilo (ou derivados). Mas pouco sei eu sobre essas coisas. É só mais uma vez o meu olhar curioso de jornalista carregando meu foco para aquilo que não está na pauta.
Às vezes isso me incomoda um pouco, mas também já aprendi que isso faz parte do meu processo. A mensagem chega, preciso seguir sua orientação. Por vezes, o que ela traz é um texto pronto. Ou um poema. Por outras, é uma ideia. Ou um início. E dessa mistura entre magia e trabalho braçal, sai o meu escrever. O meu estilo marcado.
Esse final de semana li A Hora da Estrela. Um livro da Clarice Linspector. O último que ela escreveu. Eu já havia lido esse livro antes, mas não lembrava dele e, como obra do acaso, o título apareceu na minha cabeça para nunca mais sair. Comprei um exemplar para chamar de meu. Como disse, aprendi a aceitar essa conexão com o divino (seja ele o que for).
O livro desafia a realidade escancarando a realidade. Mas como? Impossível explicar! Uma mistura de verdade que insistimos em jogar para baixo do tapete, com uma chuva de pensamentos desconexos – ainda que cheios de nexo – que surgem justamente no escrever. A protagonista tá ali, atrapalhando a vida do autor (sim, ela mesma se retira desse papel nesse livro). Ela precisa nascer, precisa ganhar vida. E enquanto isso não acontecer. Pode esquecer da vida. Do foco. De qualquer tentativa de produtividade.
Longe de mim querer me comparar com a Clari. Mas como me conectei a esse processo! Talvez tenha sido por isso que o universo tenha insistido comigo para que eu relesse a obra. Para que eu entendesse que somos todos canal. Para alguns, a mensagem se manifesta em texto, para outros, talvez em bolo de fubá. Vai saber…
O importante é estar atento. “A sobrevivência depende da sanidade, e a sanidade consiste em prestar atenção. A qualidade da vida é sempre proporcional à sua capacidade para o deleite. A capacidade de se deleitar é o dom de prestar atenção.” Eu sei, você deve estar pensando que essa frase é da Clari. Mas não é. É da Julia Cameron, mais uma das autoras que tem dividido a mesa comigo nas últimas semanas. Como é bom ler mulheres. São geniais!
Mas não vou terminar esse texto com frase da Julia, sendo que foi a Clari que o inspirou. Ao invés disso, vou conectá-las. Afinal, gerar conexões é um dos grandes prazeres da vida. Ao menos da minha. Vou então dizer que prestar atenção gera curiosidade. Gera perguntas. E…
“Enquanto tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. Como começar pelo início, se as coisas acontecem antes de acontecer? Se antes da pré-pré-história já havia monstros apocalípticos? Se esta história não existe, passará a existir. Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois juntos – sou eu que escrevo o que estou escrevendo.”
Cresci ouvindo sobre a dualidade entre exatas e humanas. Um é racional, o outro, emocional. Um toma decisões com base em análises estatísticas, o outro, confia na sua intuição. Um gosta de números, o outro de pessoas.
Tudo balela! Vamos combinar? Não tem como fazer análises frias, quando falamos de gente (e empresas são gente, clientes são gente, comunidade é gente!). E Não tem como manter a sustentabilidade de qualquer negócio achando que dados não importam.
Eu mesma me vejo tão no meio disso tudo. Adoro as possibilidades de análise que podemos fazer a partir de fatos e, ao mesmo tempo, me vejo aqui entre textos e poemas, abraçando a filosofia do que não pode ser compreendido.
Mas o cenário não nos permite mais aceitar o não compreendido. Não nos permite o não compreender. Perdemos a filosofia, perdemos o romance, perdemos o apreço pelo que nos envolve, conquista, cativa. A gente não sensualiza mais. Quer ir direto ao ponto. Sem preliminares.
As empresas estão abrindo as portas para engenheiros com fórmulas prontas, que dominem o algorítimo e entreguem resultado. Nem que seja um resultado mecânico, manipulador. E as portas estão se fechando para quem gosta da magia que envolve o ser (humano). É a engenheirização do trabalho. Uma pena.
É menos emoção e mais 10 dicas infalíveis. É menos se perder, e mais ser encontrado. São planilhas de receitas mágicas com feitiços prontos ainda que, veja só que irônico, não reconheçam a validade do encantamento.
Não precisava ser assim, mas lá vamos nós polarizando as coisas de novo. Um board de matemáticos lidando com… pessoas! Dados, números, métricas. Onde fica o espaço da imaginação, da criatividade, das possibilidades? Imagino Edgar Morin soltando gargalhadas a essa altura.
Mas não quero passar aqui por alguém amargurada, sofrendo de um recalque que não me pertence. Se isso nos chega a um preço, logo a gente dá um jeito de banaliza-lo. Aguardem. Muito em breve, na faculdade EAD mais perto de você: engenharia das artes, engenharia da comunicação, engenharia da biologia, engenharia da (complete aqui com o que você quiser).
Mas talvez esse texto não chegue até você. Afinal, ele foi escrito por uma jornalista, não por uma copy writer. Ele não foi criado dentro da estrutura que o SEO pede. E ele não tem palavras chaves. Se o título fosse “três passos para atrair seguidores”. Mas não. É um texto com palavras inventadas! Que dureza!
Poesia é ar, informação é terra. Que a água nos lembre da fluidez e da infinitude, ainda que com profundidade. E que o fogo ilumine um caminho de diversidade que possibilite a alquimia perfeita para um novo presente. Encontrar o caminho do meio é dar asas à imaginação enquanto os pés tocam o chão.
Domingo fez um mês desde a minha primeira aula de taekwondo. E como é interessante perceber a minha mudança em relação a percepção de tempo de lá para cá.
No início, eu, uma faixa branca de 40 anos, me propondo a começar algo do zero, me vi numa situação de absoluto desconforto. Eu estava ocupando o lugar de pessoa que menos sabe na sala. E quem me conhece sabe, esse não é um papel que gosto de desempenhar.
Nada dava certo! A flexibilidade que eu sempre tive, estava completamente enferrujada. A facilidade que eu julgava ter para aprender, se viu prejudicada entre golpes, movimentos, sequências, posição dos pés, dos dedos, dor, socorro…! E no meio disso tudo, comandos em coreano, nomes em mandarim, uma qualidade de líder, uma frase, uma meta… Se tinha uma imagem de caos, era eu tentando me encontrar no meio a tantas novas informações. E eu nem falei das armas…
As aulas passavam e eu parecia não sair da primeira. O tempo parou! Chegava em casa e buscava vídeos para eu não esquecer dos movimentos. Comecei coreano no Duolingo, baixei vocabulário específico… Enfim, abracei o desconforto. Queria escrever, mas dividir com quem não pratica, seria já me impulsionar para um lugar de quem sabe mais. E eu quis permanecer aprendiz.
Aos poucos, as coisas foram melhorando. Todos ainda sabem mais do que eu, incluindo as crianças, mas hoje o desconforto já não é mais tão grande. O corpo obedece melhor, a mente busca por referências que, pasme, me levaram aos 11 anos de patinação artística. A flexibilidade melhorou, a coordenação melhorou, a disposição melhorou e a energia nem se fala… se expandiu para outras áreas da minha vida. As dores seguem, e acho que ainda seguirão por bastante tempo.
Hoje recebi o brasão, simbolizando a realização da minha primeira meta: praticar atividade física com consistência. Pode parecer fácil, mas pra quem vive na intensidade como eu, buscar a consistência e estabelecer um novo padrão é extremamente difícil. Eu vou, talvez, no sentido oposto da maioria dos colegas. Andar para cima eu sei, preciso aprender a andar para o lado.
Agora, passado um mês, a sensação é de que se foram três. Já aprendi uma enormidade de chutes e novas palavras. Ainda tenho muita dificuldade com flexões, mas a alegria de chutar – e quebrar – a madeira compensa. Conheci uma filosofia linda que, vejam só, usa a natureza como metáfora para o desenvolvimento. Da semente que precisa ser nutrida, passando pela planta que busca o sol, até chegar numa árvore que, por si só, rende novas sementes, é um ciclo lindo que se retroalimenta. Não parece o fit perfeito com quem estuda ciências holísticas?
Saímos em recesso, eu mumificada em salompas e com o cotovelo da Senhora Solange tatuado no pé (quem mandou chutar?), mas louca pelo retorno das aulas. E se teve algo que contribuiu fortemente para o atingimento da minha meta, foi justamente o fato de ter me apaixonado por essa modalidade. Hoje, pensar que sou uma faixa branca de 40 anos não me traz desconforto, mas orgulho por ter me permitido começar algo novo. E volta e meia me pego rindo ao xingar em pensamento o Senhor Miguel ou o Senhor Augusto por algum novo músculo descoberto no corpo.
Seguimos com confiança, afinal, essa é a qualidade do próximo trimestre. Porque sim, eu posso – qualquer coisa que eu quiser.