<English version below>
Hoje faz um ano do dia em que cheguei na floresta Amazônica peruana. Um período de 12 dias com uma mescla entre silêncio, dieta xamânica e medicinas naturais. Aprendi ao longo da vida que quando queremos promover uma mudança, devemos começar o mais local possível. E o mais local possível é sempre nós mesmos.
Escrevi muito enquanto estive por lá. Reflexões sobre o que me fez procurar esse caminho. Visões que se apresentaram para mim através da Ayahuasca. E mesmo os sentimentos de poder que Noya Rao me trouxe.
Decidi que vou publicar partes. Por partes.
Farei uma edição, afinal, um processo como esse mexe muito com nosso íntimo. E o íntimo nem sempre precisa ser exposto. Também porque compartilharam desse íntimo comigo algumas pessoas, e quero preservá-las. Ainda assim, acredito que possa contribuir para a reflexão de outros. Ou, no mínimo, trazer um pouco de luz aos efeitos e sensações provocados pelas plantas medicinais.
“Agora chega”, pensei comigo mesma enquanto entendia a resposta da pergunta que eu sequer havia conseguido formular.
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Haviam sido anos de muito trabalho, de muito esforço e de muita dedicação. Cursos e cursos em busca de desenvolvimento técnico e intelectual. Algumas tentativas de entender uma visão mais holística do mundo, mas na prática, muita teoria. Não havia dúvidas de que eu havia alcançado algo grandioso. Especialmente para as pretensões daquela adolescente que decidiu fazer jornalismo para viver uma vida de viagens, sem rotina e de pouco dinheiro.
Eu estava comemorando 12 anos na empresa que me viu crescer. Não apenas. Na empresa que me empurrou pra cima. E eu havia aproveitado cada oportunidade que aparecera para mim. Vieram viagens, nacionais e internacionais. Imensos desafios que foram de cultura a negócios. Aprendi que não pertenço a lugar nenhum, assim como nenhum lugar pertence a mim.
Pratiquei o desapego, perdi datas importantes, para outros e para mim mesma. Entendi o amor para muito além do romantismo. Aprendi a amar minha própria companhia e por diversas vezes, preferi o silêncio da solidão à conversa rasa de uma troca qualquer. Nunca suportei conversas rasas. Se eu não estivesse disposta a mergulhar fundo, nem comparecia. Os amigos entendiam. Não usava meias palavras nem inventava desculpas. Era a verdade nua e crua. “Não estou a fim, obrigada”.
Nos últimos cinco anos, minhas atenções ganharam um segundo foco. Um empreendimento em família que me causava mais frustração por não conseguir ajudar, do que trabalho de fato. É engraçado pensar sobre isso. Talvez por isso que, mesmo atuando pouco, me parecia tão pesado.
Meu trabalho principal me exigia cada vez mais. Reuniões políticas, férias e feriados com interferências frequentes, uma responsabilidade que me fazia colocar a função acima de qualquer coisa. Acima de mim mesma.
O tempo passou e aceitei o convite para uma nova sociedade. Não foi um sim fácil. Pensei muito sobre o que eu vislumbrava para meu futuro, empurrada por uma sequência de cursos e leituras que mostravam que empreender era a única forma de alcançar o paraíso. E lá fui eu, me jogar de cabeça no que seria o meu terceiro emprego.
Em pouco tempo, me vi soterrada em trabalho. Sentir sono era uma constante. Eu tinha tanta coisa para fazer no meu dia, que só de pensar, me sentia cansada. E mais, muitas das coisas dependiam de outros e qualquer procrastinação que não a minha, me tirava do sério. Sentia como se eu precisasse ir embora.
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Busquei terapia na primeira vez que me ofereceram um cargo de liderança. Eu precisaria lidar com uma equipe e eu sabia que não tinha lá muito jeito para isso. Precisaria desenvolver melhor a empatia, compreender perfis, aceitar ritmos diferentes do meu.
Um ano com psicóloga, com apometria, com regressão e tudo o mais que poderia imaginar. Um ano de crescimento. Um ano de muitas descobertas. E poucos meses para que eu percebesse o tamanho do espaço que o trabalho ocupava na minha vida. Eu não tinha outro assunto. Eram sempre as frustrações e as conquistas profissionais em pauta. E uma tentativa frustrada de soterrar a obesidade que chegava cada vez com mais força.
Assim, fiz o que a maioria das pessoas que entende que precisa de cura faz: me dei alta!
Não passou muito tempo para que eu fosse buscar ajuda de novo. Dessa vez o foco seria em mim, mas antes, precisava tirar algumas questões de trabalho do caminho. Mudei bastante. Aprendi a ser uma pessoa mais paciente e tolerante. Entendi que a justiça poderia ser feita sem guerras e que por vezes o carinho funcionava muito melhor do que o pontapé na porta. Não posso negar que cresci. Aprendi a lidar melhor com as pessoas e, ao mesmo tempo, fui reconhecendo minhas falhas e deficiências.
Eu falava constantemente sobre deixar o emprego e focar nas duas empresas nas quais eu era sócia. Parecia o caminho mais acertado, mais natural. Ainda assim, me faltava coragem. Na verdade, faltavam tantas coisas que eu nem saberia dizer. Síndrome do impostor, insegurança, medo da falta de reconhecimento, estranhamento com um possível novo cenário. Parecia que o momento nunca chegava e eu ia, a cada dia, acumulando mais funções e tarefas. Um ciclo vicioso, infinito e artificialmente funcional.
Na terapia, a cada consulta, a vontade de largar o emprego ía ou vinha. Ou eu me convencia de que pedir demissão era a solução dos meus problemas, ou me convencia de que meu trabalho lá me engrandecia e promovia o bem. O bem de quem?
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Mas finalmente o dia chegou. O dia em que eu entendi que o problema não estava em uma ou outra empresa, mas na minha forma de vê-las. Meu modus operandi de quem preenchia sua vida com conquistas profissionais e não espera nada menos do que o brilhantismo me catapultou para longe de mim mesma. Não adiantaria sair de uma empresa, nem de duas ou três. O problema não estava fora, estava dentro. Eu precisava mudar a mim mesma, desinverter minhas prioridades invertidas. Eu precisava ouvir minha própria voz com atenção e buscar uma cura para essa doença que eu não sabia nomear.
Assim, decidi pela demissão. Mas também decidi que era hora de cuidar de mim. “Agora chega”, pensei comigo mesma enquanto entendia a resposta da pergunta que eu sequer havia conseguido formular.
One year ago I stepped into the Peruvian Amazon rainforest for 12 days of silence, shamanic dieta, and plant medicines. I have learned throughout my life that when we want to promote a change, we must start as local as possible. And the most local we can get is ourselves.
I would write a lot while I was there. Reflections on what made me seek this path. Visions that were brought to me through Ayahuasca. And the empowerment presented to me by Noya Rao.
I now decided it is time to share some parts of it. In parts.
I’ll edit it, after all, this kind of processes deal with some intimate issues. And intimacy should not always be exposed. I also shared these intimate moments with some special people, who I want to preserve. Still, I believe it can contribute to the reflection of others. Or, at the very least, bring a little light to the effects and sensations caused by plant medicines.
“It’s enough”, I thought to myself as I realized the answer to a question I have not yet been able to elaborate.
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It had been years of hard work, effort, and dedication. Courses and courses in search of technical and intellectual development. Some attempts to understand a more holistic view of the world, but in practice, a lot of theory. There was no doubt I had achieved something great. Especially considering the pretensions of the teenager who chose journalism as a career, to live a life of travel, no routine, and very little money.
I was celebrating 12 years at the company that saw me grow. Not only. In the company that pushed me up. And I took every opportunity that showed up to me. Many travels came, nationally and internationally. Immense challenges that went from culture to business. I learned I don’t belong to one place, and no place belongs to me.
I practiced to let go, I lost important dates, for others and myself. I understood love as something far beyond romanticism. I learned to love my own company and on several occasions, to prefer the silence of solitude to the shallow conversation of any exchange. I never endured shallow conversations. If I wasn’t willing to go deep, I simply wouldn’t show up. Friends understood me. I never used half-words or made excuses. It was the bare truth. “I’m not in the mood, thanks.”
In the past five years, my attention gained a second focus. A family enterprise that would frustrate me for the simple fact that I wasn’t able to help as much as I wished I would. It’s funny to think about it. Perhaps that is why, even though I act little, it seemed so heavy.
My main job demanded more and more of me. Political meetings, vacations and holidays with frequent interference, a responsibility that made me put the role above anything. Above myself.
Time passed and I accepted the invitation to a new society. It was not an easy yes. I thought hard about what I envisioned for my future, pressured by a sequence of courses and readings that showed that entrepreneurship was the only way to reach paradise. And there I went, throwing myself on a third job.
Before long, I saw myself buried in work. Feeling sleepy was a constant. I had so much to do in my day, that I felt tired just thinking about it. To make it harder, any procrastination of others would drive me crazy. I felt like I needed to leave.
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I sought therapy the first time I was offered a leadership position. I needed to deal with a team and I knew managing people was not my strength. I would need to develop my empathy ability, understand profiles, accept the different rhythms of different team members.
A year with a psychologist, alternative therapies, and everything else you can imagine. A year of growth. A year of many discoveries. And a few months for me to realize the space work occupied in my life. I had no other subject. My conversations were always about frustrations and professional victories. And an unsuccessful attempt to overshadow obesity that was arriving strongly every day.
So, I did what most people who need healing do: I discharged myself!
It wasn’t long before I went to get help again. This time, the focus would be on me, but first, I needed to take some work issues out of my way. I changed a lot. I learned to be a more patient and tolerant person. I understood that justice can be done without wars and that sometimes love and affection can work much better than punches at the door. I cannot deny, I grew up. I learned to deal better with people and, at the same time, I started to recognize my flaws and deficiencies.
I talked about quitting my job and focusing on the two companies in which I was a partner. It seemed the right way, the most natural way. Still, I lacked courage. In fact, there were so many things I lacked, I didn’t even know where to start. Impostor syndrome, insecurity, fear of not being recognized, strangeness with a possible new scenario. It seemed that the moment never came and I was accumulating more functions and tasks every day. A vicious, infinite, and artificially functional cycle.
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So, I decided to resign. But I also decided that it was time to take care of myself. “It’s enough”, I thought to myself as I realized the answer to a question I have not yet been able to elaborate.
Linda história! Linda pessoa e personalidade!
Tu é parte dessa história! Parte importante.
Te amo!
Besos, Beta.
Abrazos.
Besos, Helmerzinho! <3